O Drama da IPO


Não sei se vos acontece o mesmo mas, para mim, o momento de proceder à Inspecção Periódica Obrigatória do meu veículo é pleno de inquietude. Posso até dizer que o nervosismo está à altura daquele que se sente quando nos encaminhamos para as pautas recém-afixadas daquele exame para o qual até estudámos razoavelmente mas cujo resultado é duvidoso.

Claro que não chega ao nervosismo que senti quando, em plena frequência da escolaridade primária, a Prof. Anunciação me apanhou a correr atrás das meninas para lhes levantar a saia, mas anda lá perto.

Outra particularidade que reveste o momento da IPO do meu veículo é o timming da mesma: sempre nos últimos dias. Não adianta eu decidir que, desta vez, será diferente e que irei logo mal receba o aviso do centro de inspecções. Nunca acontece e acabo sempre por me sujeitar a uma fila tal que mais parece que o centro de inspecções está a distribuir combustível gratuitamente.

A última então foi particularmente atribulada. Com o envolvimento no projecto de exposição, agravado pelo trabalho e pela necessidade do estudo pela iminência de um exame, deixei mesmo passar a data que está marcada a vermelho no calendário e acabei por ir no último dia.

Obviamente eu tinha um plano astuto que passava por estar às 8h30 da manhã frente ao centro de inspecções para apanhar logo aquele lugarzinho tão desejado na cabeça da fila. Logo aí começou a correr mal pois, pelos vistos, houve fuga de informação e, quando cheguei às 8h30 ao centro de inspecções, já cerca de 30 carros formavam uma fila bem desenhada pelas ruas adjacentes.

A coisa até acabou por correr bem e, aí por volta das 10h, o Caetanomobile estava a dar entrada na linha de inspecção e, claro, eu já estava acompanhado por aquele nervosismo que me povoa a mente de questões como "Será que vai dar para passar?", "Será que eles vão reparar que o LCD tem um mau contacto em alguns segmentos?", "Será que eu devia ter lavado o Caetanomobile?".

A primeira fase até passou bem: buzina confere, aspersores e limpa-vidros confere, luzes confere, luz dos travões confere após pancada, ...

O pior foi quando, ao fazer o teste dos travões, se descobriu a terrível verdade da existência de uma deficiência no sistema de travagem das rodas traseiras que consistia num diferencial de travagem das rodas superior a 50%, ou seja, uma travava mais um bocado que a outra! Por muito que eu tentasse argumentar ali que aquilo não me incomodava nada e que eu não me importava nada de travar apenas com as rodas da frente, o inspector manteve-se na sua pose de inspector: impassível e indiferente.

Assim, lá tive de me apresentar para recurso uma semana depois, já com as deficiências corrigidas, ou pelo menos assim o pensava. Verificados os travões, não pude deixar de endereçar um olhar desafiante de nítida arrogância e superioridade na direcção do inspector ao constatar que o Caetanomobile não só travava como ainda quase arrancava o alcatrão na travagem.

O pior foi quando o inspector reparou num pequeno rasgo no assento do condutor e que, tendo sido já detectado na primeira inspecção, eu não tinha reparado.

Perante a iminência de uma nova reprovação, tive de improvisar uma deslocação relâmpago à superfície mais próxima para proceder à aquisição de um conjunto de capas para os assentos do veículo. Colocada a capa sobre o assento do condutor e tendo atirado as outras para o banco traseiro, lá me dirigi novamente ao centro de inspecções.

Tendo exibido, com orgulho, a nova capa do assento do condutor do Caetanomobile, foi com não menos orgulho que recebi das mãos do inspector o tão almejado documento verde, garante de estatuto social e que qualquer pessoa ostenta de forma exuberante à saída daquele gabinete temível.

No final, fica a satisfação de possuir um veículo que reúne todas as condições de segurança exigidas e está apto a circular pela rede viária nacional! Contudo, há apenas um pequeno senão no tão almejado documento verde: a referência a um LCD que terá forçosamente de ser reparado antes da próxima inspecção...

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